Consta que em dada altura
Confúcio terá dito: “Mais do que saber a resposta, preocupa-me sobretudo o
entendimento da pergunta”. Não haverá por certo frase mais adequada do que esta
para descrever a nossa perplexidade com a leitura do primeiro capítulo do
relatório do Conselho Nacional de Educação (CNE) Estado da Educação 2014, conhecido a 16 de Outubro. Publicado
anualmente, este relatório pode constituir um contributo importante para o
conhecimento dos aspectos mais positivos, bem como para os problemas
fundamentais da educação em Portugal, tal o manancial de informação que convoca
e analisa. No entanto, tal contributo pode vir a ficar completamente diluído
face a análises no mínimo polémicas e de rigor altamente duvidoso como a que o
presente relatório desenvolve a propósito do tema Educação e desenvolvimento económico (1º Capítulo).
Consideremos a “questão de
investigação” de partida: “A evolução dos
resultados obtidos pelos alunos portugueses é melhor que a evolução do desenvolvimento
do país?” (CNE 2015, pg 13). De imediato se nos coloca a seguinte dúvida: qual
a pertinência de uma tal comparação, mais semelhante a um confronto de
desempenhos entre duas corridas de obstáculos protagonizadas por atletas de
modalidades diferentes, com itinerários não comparáveis e à custa de recursos e
meios que, devendo ser solidários e concorrer para um grande objectivo comum, frequentemente
concorrem entre si?
E, em seguida: como se mede
aquela evolução dos resultados dos alunos? Dado que, como é referido, se
constatou uma melhoria significativa nos valores (scores) obtidos em Matemática nos últimos inquéritos PISA, são
estes valores, e só eles, os utilizados na análise da evolução. Note-se que se
trata não mais do que indicadores de ordenação, resultantes de testes
estandardizados, sem qualquer tradução em domínio de capacidades básicas e
conhecimentos fundamentais dos alunos. Note-se, também, que tais pseudo indicadores
nada indicam sobre outros resultados obtidos
pelos alunos portugueses, como os que respeitam à persistência de elevadas
taxas de retenção ou à quebra abrupta da educação e formação da população
adulta, para referir apenas dois domínios em que nos encontramos muito longe,
ou retrocedemos mesmo, face, por exemplo, às metas e compromissos que assumimos
no âmbito do Horizonte 2020. Além do mais, conviria que a análise da série de
anos estudados não fosse truncada e permitisse levar em conta que, em anos
recentes, se constataram retrocessos naquele indicador de “desempenho” em
Matemática… E que, desse modo, a frase “A
melhoria sustentada dos resultados de Portugal posiciona o país com um olhar
positivo para o futuro” (CNE 2015, pg 16) nos pareça, no mínimo, patética.
Perde-se ainda esta análise com
exercícios desnecessários de clusterização estatística, de molde a poderem
comparar-se países “homogéneos”, procedimento que acaba por ser substituído
pela comparação única com os resultados da Polónia enquanto referência em
termos educativos. E, do mesmo modo, se esforça à outrance por demonstrar que Portugal verifica os resultados de
Goldin & Katz, autores destacados no relatório por terem descoberto a evolução
contra cíclica do desenvolvimento económico e da evolução das qualificações…
Como se grande parte dos bons resultados educativos do nosso País nesta fase
recessiva, a verificarem-se efectivamente, e ao contrário de grande parte das
outras sociedades europeias, nada tivessem a ver com a recuperação potencial do
atraso secular da educação em Portugal.
A quem aproveita tão absurda
tentativa de “dourar a pílula”, neste fim de ciclo político?
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