Vem este comentário no
seguimento do post de 22 de Outubro
último. Referíamo-nos então aos resultados presentes no 1º Capítulo do Estado da Educação 2014 (ler aqui)
e à bizarra comparação que aí se pretendeu fazer entre a evolução do
crescimento económico português e a evolução dos – de alguns…- resultados
escolares. Nesse capítulo sumariza-se ainda um estudo, da autoria de Hanushek
& Woessmann (2015), de título Universal
Basic Skills: What countries stand to gain, que nos merece o presente olhar
crítico.
No discurso inaugural que hoje
proferiu na Fundação Gulbenkian, no âmbito da Conferência Educação e Desenvolvimento Económico
organizada por aquela Fundação, Eric Hanushek teve oportunidade de apresentar o
mesmo trabalho. A temática essencial, centrada no contexto do sistema educativo
norte-americano e baseando-se na metodologia da educação comparada, é a da
qualidade da educação. Nele se criticam hipóteses básicas do modelo do capital
humano, como a equivalência entre conhecimentos escolares e número de anos de
escolaridade, presente em muitos dos modelos econométricos que visam determinar
a influência da educação no desenvolvimento económico, como o também ali proposto
por Miguel St. Aubyn, por exemplo. Mas se Hanushek tem razão nesta crítica – people around the world learn different things
during a same scholar year, nas suas palavras – pouco ou nada adianta ao
propor como indicador de qualidade da educação o nível 1 do PISA, aliás
restrito apenas à proficiência em Matemática, como se refere no Estado da Educação 2014.
Ainda mais passível de
crítica, em nossa opinião, é a visão estreita que Hanushek tem do processo
educativo. Como se mede a qualidade da educação? Em sua opinião, através da
aferição regular do desempenho dos estudantes, em sucessivos testes e exames
finais. Como deve a qualidade da educação ser promovida? Pela qualidade dos
professores, o factor mais importante, como diz. E que deve entender-se por
professores de qualidade? Os que reúnem experiência significativa, graus
académicos adequados, preparação e profissionalização irrepreensíveis. Tudo
isto a ser atestado… pelos resultados dos alunos nos testes e exames. E,
naturalmente, a ser premiado, na medida do possível, por complementos
monetários em função daqueles resultados, sempre na base de uma rigorosa accountability... De especial relevância
se deverá revestir, acrescenta, a compensação monetária aos directores das
escolas, incentivo ao seu empenhamento constante num quadro adequado de
autonomia. Ainda de significativa importância é o exercício da escolha,
processo através do qual os pais dos alunos premeiam as escolas boas, retirando
os filhos das de má qualidade. Figurino exacto da escola norte americana; mas “importável”
como receita para o sistema de ensino português? Nada mais errado.
O que dizer sobre as
condições salariais, de estabilidade contratual, de formação contínua e de
carreiras do pessoal docente? Qual será então o papel do currículo? Questões
colocadas pela assistência, às quais acrescentamos a nossa perplexidade pela total
ausência de consideração do estatuto sócio económico das famílias, do contexto
de residência, da escolaridade e inserção profissional dos pais e das mães dos
alunos, da capacidade efectiva de escolha que lhes possa assistir. Sendo necessário
investir muito mais em educação, lançar dinheiro sobre os problemas não é
suficiente, diz Hanushek.
Pois não, sobretudo quando o
processo educativo é esquematizado de forma tão restritiva, posto em termos social
e politicamente tão assépticos e, sobretudo, sem a preocupação de proceder à
indispensável relativização histórica, cultural e social que desautoriza a
imposição de receitas estranhas e ainda menos democráticas.
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