Talvez numa tentativa de dar
resposta às inúmeras críticas de que tem sido objecto em matéria de política
científica, o actual Governo apressa-se agora, em pleno período eleitoral, a
tentar por em prática os Centros de Excelência (CE). Estes Centros, resultado
de protocolos estabelecidos em 2014 com algumas universidades do interior do
País, visariam o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia (C&T) e da
Investigação e Desenvolvimento (I&D) nos territórios que deles menos têm
beneficiado. Em princípio, deveriam receber aprovação unânime: vários programas
eleitorais se referem à necessidade de constituição destas importantes
infraestruturas científicas. Mas para tal os CE precisariam de reunir condições
para funcionar…
Neste fim de mandato, aquela
tentativa inscreve-se no âmbito da publicidade às “realizações” deste Governo
em matéria de educação e ciência, de que é exemplo a informação hoje divulgada pelo Público de que mais de um milhar de portugueses concluíu com sucesso o processo
de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC); resultado
sem dúvida muito importante para quem o conseguiu, mas que em termos nacionais
não significa senão 3% do total de inscritos em RVCC.
Voltemos ao assunto dos Centros de Excelência, dossier tutelado conjuntamente pelos Ministro-Adjunto e do Desenvolvimento Regional e pelo Ministro da Educação e Ciência. Inexistindo no nosso País uma estratégia consistente de política científica, já que nos últimos anos se desfez tudo, ou quase tudo, o que tinha sido concebido e implementado pelo Ministro Mariano Gago neste domínio[1], duas ideias chave têm vindo, entretanto, a nortear as “políticas” de educação e ciência:
- a da redução drástica de financiamento público, em obediência cega ao primado da austeridade, a par da abertura, a todo o transe, à participação dos privados na provisão destes bens sociais;
- a
da elevação do objectivo competitividade externa, devidamente assegurada pelo
funcionamento “eficaz” dos mercados, a critério principal de eligibilidade e
financiamento dos projectos científicos.
E, assim, subjacente ao desenvolvimento daqueles Centros teria obrigatoriamente de vigorar uma parceria com o grande negócio, local ou de maior âmbito; este deveria constituir elemento indispensável ao co-financiamento, a par de fundos comunitários no âmbito do Horizonte 2020. O compromisso do Estado passava, por sua vez, pela reposição dos fundos devidos às instituições universitárias sujeitas a cortes drásticos nos últimos três anos, devendo o montante correspondente ficar expresso no memorando de constituição do CE. No caso da Universidade da Beira Interior (UBI), tal montante era da ordem de 1,5 milhões de euros, valor que o Governo não inscreveu, como devia, no memorando correspondente. Por sua vez, a Comissão de Coordenação da Região Centro, responsável pela transferência dos fundos comunitários e financiamento público, deu o dito por não dito, vindo agora a invocar a necessidade de uma melhor fundamentação do projecto. Razão última deste volte face: a situação da PT, principal financiador. E o desfecho: recusa de assinatura por parte da UBI!
Perante o que acaba de se passar, algumas questões se impõem:
Voltemos ao assunto dos Centros de Excelência, dossier tutelado conjuntamente pelos Ministro-Adjunto e do Desenvolvimento Regional e pelo Ministro da Educação e Ciência. Inexistindo no nosso País uma estratégia consistente de política científica, já que nos últimos anos se desfez tudo, ou quase tudo, o que tinha sido concebido e implementado pelo Ministro Mariano Gago neste domínio[1], duas ideias chave têm vindo, entretanto, a nortear as “políticas” de educação e ciência:
- a da redução drástica de financiamento público, em obediência cega ao primado da austeridade, a par da abertura, a todo o transe, à participação dos privados na provisão destes bens sociais;
E, assim, subjacente ao desenvolvimento daqueles Centros teria obrigatoriamente de vigorar uma parceria com o grande negócio, local ou de maior âmbito; este deveria constituir elemento indispensável ao co-financiamento, a par de fundos comunitários no âmbito do Horizonte 2020. O compromisso do Estado passava, por sua vez, pela reposição dos fundos devidos às instituições universitárias sujeitas a cortes drásticos nos últimos três anos, devendo o montante correspondente ficar expresso no memorando de constituição do CE. No caso da Universidade da Beira Interior (UBI), tal montante era da ordem de 1,5 milhões de euros, valor que o Governo não inscreveu, como devia, no memorando correspondente. Por sua vez, a Comissão de Coordenação da Região Centro, responsável pela transferência dos fundos comunitários e financiamento público, deu o dito por não dito, vindo agora a invocar a necessidade de uma melhor fundamentação do projecto. Razão última deste volte face: a situação da PT, principal financiador. E o desfecho: recusa de assinatura por parte da UBI!
Perante o que acaba de se passar, algumas questões se impõem:
–
Se as empresas potenciais financiadoras sofrerem restruturações de monta, forem
privatizadas, se desinteressarem pela actividade em Portugal…a que se reduzirá
a nossa política científica?
–
Naquelas condições de co-financiamento pelo grande negócio privado conseguirá a
investigação científica dos CE manter a sua autonomia? Exercerá, de facto, o
Estado a função de regulação de I&D que lhe está atribuída pela
Constituição?
–
Poderemos vir a assistir à constituição de CE em áreas de investigação caras às
Ciências Sociais e Humanas, domínios em que, como é sabido, os resultados
científicos raramente suscitam o interesse dos mercados? Como se propõe o
Governo corrigir este enviesamento?
[1] Basta
lembrarmo-nos que, de acordo com a base PORDATA (www.pordata.pt),
a participação do Estado no financiamento de I&D tinha recuado em 2013 para
o nível de 1997.
As opções em matéria de política científica devem merecer a atenção dos eleitores e eleitoras no próximo acto eleitoral, como bem salienta a autora deste post.. Para que tal seja possível exige.se das diferentes forças políticas que apresentem com clareza as suas propostas e dêem as devidas garantias da sua respectiva exequibilidade.
ResponderEliminarO mecenato tem a sua razão de ser mas sem uma aposta séria na política pública dirigida para a investigação fundamental nas diferentes áreas disciplinares corre-se o risco de um lamentável empobrecimento neste domínio.com consequências dramáticas para um desenvolvimento humano sustentavel
Na sequência de uma análise atenta e crua da realidade do panorama de investigação em Portugal, a autora colocou algumas questões bem pertinentes sobre o futuro da investigação científica no país, para as quais adianto algumas respostas, meras opiniões de quem se interessa por estes assuntos.
ResponderEliminarR1 – Dificilmente se pode acreditar que os responsáveis pela política científica nacional estejam interessados no potencial investigativo das Portuguesas e dos Portugueses bem como na produção científica do país pois, de contrário, nunca deixariam a política de investigação (bem como a de educação, a de saúde, etc.) nas mãos de entidades que desinvestem quando a taxa de lucro é inferior à esperada; e sabemos como algumas dessas actividades, de que a investigação é um exemplo forte, implicam elevados investimentos que podem, até, nunca ter retorno directo.
R2 – A realidade faz-nos esperar o pior, isto é, dificilmente a investigação científica não será condicionada pelas expectativas dos financiadores. Aquilo que já acontece no ensino superior e as denominadas “políticas de diversificação de fontes de financiamento” aponta nesse sentido de perda de autonomia das instituições e dos investigadores. Note-se que não se está aqui a questionar negativamente essa diversificação nem a necessária ligação da investigação com o "mercado" mas a afirmar-se que nas actuais condições a investigação científica poderá tornar-se numa mera produção do conhecimento que esse mercado pretende para aumentar as suas vendas e receitas.
R3 – O que se tem verificado com a avaliação das unidades de investigação científica nos últimos anos, com as unidades ligadas às Ciências Sociais e Humanas a serem desclassificadas de forma brutal e, concomitantemente, a perderem financiamento e capacidade de investigação, leva-me a pensar que esse enviesamento nem será objecto de qualquer tipo de preocupação por parte de quem a deve ter.
Em jeito de conclusão, promover a investigação científica e garantir que se encontra ao serviço dos portugueses e do desenvolvimento humano sustentável, exige uma política de investigação científica diferente daquela que tem sido apadrinhada pelas actuais forças políticas no governo.