7 de julho de 2016

A quebra demográfica e a qualidade do ensino

Nos últimos dias a imprensa tem vindo a insistir no facto de se prever uma redução de cerca de 1000 turmas, no próximo ano lectivo, nos ensinos básico e secundário. Esta prevista diminuição, decorrente da acentuada quebra demográfica que bem conhecemos, pode e deve mesmo, em nossa opinião, conhecer uma muito mais frutuosa solução alternativa que possa, ao mesmo tempo, levar a uma melhoria da qualidade do ensino.

Comecemos por considerar alguns indicadores. Em 2014, a percentagem de jovens portugueses, dos 25 aos 34 anos, com o ensino secundário e o pós secundário não superior completos situava-se em 33%, sendo de 42% e 45%, respectivamente, os correspondentes valores para a OCDE e para a U.E.- 21 (OECD 2015, Education at a Glance, http://www.oecd.org/education/education-at-a-glance-19991487.htm). Por outro lado, a taxa média de conclusão com sucesso dos ensinos básico e secundário era, no Portugal de 2015, de apenas 78%, resultado que associado à constatação anterior revela o impacto do insucesso escolar na modéstia dos resultados educativos portugueses. Segundo dados da Direcção Geral das Estatísticas da Educação e Ciência, as taxas de retenção e desistência no conjunto dos três ciclos do ensino básico, que vinham a registar um decréscimo significativo desde o ano lectivo de 2003/2004, voltaram a aumentar a partir do ano lectivo de 2011/2012, situando-se em 2013/2014 a um nível idêntico ao de 2006/2007[1]. Segundo a mesma fonte, também desde o ano lectivo de 2010/2011 se verificou de novo um aumento da relação alunos/docente nos três ciclos do ensino básico e no secundário, chegando-se no ano lectivo de 2013/2014 a valores daquela ratio superiores ao de toda a década anterior.

Não valerá a pena referenciar neste post os numerosos contributos que têm estudado a influência da dimensão das turmas – entre outros factores – no insucesso escolar em Portugal. A equipa de autores do Projecto Pensar a Educação. Portugal 2015 desenvolveu também este aspecto, no âmbito do capítulo relativo aos temas organização, administração e financiamento do sistema escolar, como pode constatar-se através da leitura dos dois livros a que o Projecto deu lugar[2]. Num Parecer recente do Conselho Nacional de Educação – Organização da escola e promoção do sucesso escolar, de Junho de 2016 (ler aqui ) –  o relator, Professor Joaquim Azevedo, ilustra igualmente como a existência de turmas sobredimensionadas, a par da coexistência de diferentes anos curriculares numa mesma turma,  se destaca no conjunto dos principais determinantes do insucesso.

O actual governo tem vindo a mostrar preocupação com o problema do elevado insucesso escolar e concebeu mesmo um programa de tutorias que consiste, essencialmente, num complemento de horas de estudo, assistidas pelo tutor, para os alunos em risco de retenção de ano ou ciclo. Não se negando que desta medida venham a decorrer potenciais efeitos positivos, sublinha-se, no entanto, que as melhores prácticas de combate ao insucesso têm passado, entre outras metodologias complementares, pela redução do número de alunos por turma, com as seguintes vantagens: capacidade de dinamização de trabalho e aprendizagem em pequenos grupos, com maior proximidade e envolvimento do professor, num ambiente menos propício à indisciplina e desmotivação. E com a possibilidade de os professores conduzirem mais eficazmente os projectos que concebem, num contexto estável, evitando também a sua desmotivação.

Ora a diminuição do número de alunos por turma constitui objectivo que, nas palavras do governo, se prosseguirá paulatinamente e só em próximos anos lectivos. Não seria, então, de aproveitar os efeitos da quebra demográfica agora tão sublinhada para introduzir desde já e de forma sistemática aquela diminuição, em alternativa à redução do número de turmas?


[2] Manuela Silva e outros (coord. 2015). Pensar a Educação. Portugal 2015 e Pensar a Educação. Portugal 2015 – temas sectoriais. Lisboa: EDUCA. 

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